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segunda-feira, 11 de abril de 2016

O que se sabe atualmente sobre o universo...

Uma contribuição do físico Alexandre Fernandes (Lattes  aqui) para Deus e a Ciência...

            Quando você liga um rádio em uma frequência definida, o seu aparelho está captando, para ouvir a sua música preferida de forma lima, uma onda muito específica. Mas, o que acontece se você sintonizar em outras faixas que não tem rádio? Ouvirá um ruído. O mesmo acontece com as antigas televisões analógicas quando está procurando um canal e tem aquela "imagem" de chuvisco. O que é esse ruído ou essa "imagem"? A maior parte dela vem de um universo primitivo, de mais de 13 bilhões de anos.

            A descoberta da natureza desse ruído dá-se ao acaso. Em 1964 Arno Penzias e Robert Wilson estavam trabalhando com uma antena e tentaram eliminar um ruído que vinha de todas as direções, chegando a limpar a antena da sujeira de pombos que viviam por perto. Sem sucesso e com mais estudos posteriores, em 1978 os dois levam o Nobel de física pela descoberda da radiação cósmica de fundo em micro-ondas (ou CMB, do inglês cosmic microwave background).

            Como toda onda eletromagnética, a CMB tem uma frequência definida e vem de todos os lados. Onda eletromagnética, como a gente vê no ensino médio, é uma onda “composta” de fótons, que são partículas de luz. Cada frequência tem uma cor (como no caso do espectro visível) e, com isso uma temperatura. Ou seja, todo corpo emite radiação eletromagnética e a frequência em quê ele emite está relacionado com sua temperatura.






Fig. 1. Espectro eletromagnético (extraído de FEUP - PSTFC )

O efeito Doppler (de se ouvir um som mais agudo quando uma sirene se aproxima e mais grave quando ela se afasta) também está associado às ondas de luz. E a detecção dessa onda, através de sua temperatura, nos dá informações das propriedades da fonte de emissão.

            Sucedendo o COBE (Cosmic Background Explorer) e o WMAP (Wilkinson Microwave Anisotropy Probe), a sonda Planck fez um mapa detalhando de cada flutuação da CMB. Ele é fruto de 15 meses de dados coletados. Após as análises temos, até o momento, os detalhes mais refinados sobre o universo, envolvendo sua idade e sua composição.





Fig. 2. Mapa do universo com base na CMB (extraído de Planck Mission)

Olhando esse mapa, os pesquisadores da missão Planck tiraram algumas informações precisas, pois já tínhamos ideia, de sondas anteriores, sobre a composição, idade e a velocidade de expansão do universo. Só que agora se tem muito mais refino, ou seja, a precisão é muito maior do que antes.

            Sobre a composição do universo: quase ¾ do universo é composto de energia escura, 27% de matéria escura (não confundir: matéria escura é algo completamente diferente e distinto, sem relação ou interação com energia escura) e apenas quase 5% é de matéria ordinária, ou seja, muito menos de 10% do universo é tudo o que conhecemos, vemos e sentimos, incluindo planetas, galáxias, aglomerados de galáxias, poeira etc. 





Fig. 3. Composição do universo (extraído de Plank Mission)

            A matéria escura seria algo que ainda não sabemos o que é e que interage apenas gravitacionalmente. Ou seja, não podemos visualizar aglomerados de matéria escura, mas podemos visualizar efeitos gravitacionais (lentes gravitacionais) provocados por ela. Por exemplo, no aglomerado de galáxias Abell 1689, quando se analisa todos os efeitos gravitacionais de todas as galáxias, observa-se que “falta” mais matéria (bariônica, ou seja, que emite luz; que seja feita de partículas conhecidas), pois há muita curvatura ou lente gravitacional mas a quantidade de matéria que se observa não é suficiente para tal fenômeno. E isso se estende para vários outros casos, como uma estrela que, na periferia de uma galáxia, deveria ter uma velocidade menor do que uma que está mais ao centro. No entanto, a velocidade é praticamente a mesma.



                

Fig. 4. Aglomerado Abell 1689

            Já a energia escura é algo menos intuitivo e mais complicado de se perceber. Em 1998 duas equipes (Supernova Cosmology Project e High-z Supernova Search Team) observaram que o universo estava se expandindo de forma acelerada, mas que não há “nada” afastando as galáxias. Por suas análises usando supernovas (explosões de estrelas que têm um brilho e uma forma de funcionar bem definidos e conhecidos) e muitas técnicas de física estatística, chegaram à conclusão de que quando o universo tinha 7,8 bilhões de anos de idade, começou a se expandir aceleradamente. Em 2011 os representantes das duas equipes (Saul Perlmutter, Brian Schmidt e Adam Riess) ganharam o Nobel de física por essa descoberta.
  
            Através da lei de Hubble e das análises do magnífico mapa feito pelo Planck, a constante de Hubble foi mais bem aproximada: 67,3 Km/s/Mpc, ou seja, a expansão do universo está a 67,3 Km por segundo a cada um megaparsec de distância (1 parsec = 3,26 anos-luz e 1 ano-luz = 9,46 trilhões de Km, considerando a velocidade da luz como de 299.792.458 m/s). Usando a mesma lei de Hubble e outras informações a mais do mapa, temos uma idade muito mais aproximada para o universo: 13,8 bilhões de anos.
  
            Além do mais, com esse mapa, foi obtido um suporte mais firme para a inflação, que foi um período muito curto de tempo, no início do universo, onde ele literalmente se inflacionou, ou seja, seu crescimento deu-se a taxas de 1029; em um tempo muito curto, um volume de um metro cresceu até 10.000.000.000.000.000.000.000.000.000 metros em cada lugar do universo (que estava “nascendo”).

            É incrível como de uma “simples” observação de um aparelho podemos tirar tantas informações acerca do universo. Usando a relatividade geral e várias outras teorias, que têm fortes fundamentos observacionais e experimentais, podemos construir toda a história do universo até nossos dias.




 
Fig. 5. A história do universo (extraído de Plank Mission)

Para mais detalhes sobre esse assunto há vários livros muito bons:

* Introduction to cosmology, de Barbara Ryden (editora Addison Wesley)

* Introduction to cosmology, de Matt Roo (editora Wiley)

* An introduction to the science of cosmology, de Derek Raine e Ted Thomas (editora IoP)

* Gravity: an introduction to Einstein’s General Relativity, de James Hartle (editora Pearson Education)

Outras boas fontes:

* Missão Planck, em cooperação com ESA e NASA: http://planck.cf.ac.uk/results/cosmic-microwave-backgroundhttp://www.esa.int/Our_Activities/Space_Science/Planck e https://www.nasa.gov/mission_pages/planck/

* Sobre Arno Penzias, uma biografia (do Nobel): http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1978/penzias-bio.html

* A palestra ao Nobel do Penzias: http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1978/penzias-lecture.pdf

* Sobre Robert Wilson (do Nobel): http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1978/wilson-bio.html

* A palestra ao Nobel do Wilson: http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/1978/wilson-lecture.pdf